segunda-feira, 14 de abril de 2014

Subitamente...




Um clarão cegou a todos. Subitamente...
Nada se compara ao som de uma bomba. A não ser o impacto do deslocamento do ar que provoca.
Fui jogado contra uma banca de revistas.
Quando comecei a perceber o mundo, senti uma enorme dor em meus ouvidos, dilacerados.
Estilhaços rasgaram minha camisa e cortaram minha pele.
A poeira começa a baixar. Pequenos incêndios, aqui e ali.
Há semimortos na calçada. Uma chuva de pedaços de qualquer coisa cai sobre nós. Um cheiro de enxofre e carne queimada toma conta do ambiente.
No meio-fio curto, algumas sombras hirtas de seres que ainda não tomaram senso do ocorrido, olham para lugar nenhum.
A praça onde acontecia o show, larga e convidativamente tranqüila, se estreita e fica pequena diante do horror ali perpetrado.
Sirenes começam a ser ouvidas entre gritos e lamentos.
O dia fica histérico.
Passo as mãos em meu corpo. Sangue escorre em minha calça, junto ao joelho semiflexionado.
Rasgo a calça num frenesi louco, esperando encontrar a origem dele. Nada. Não era meu.
Perto de mim há um corpo estendido. Homem. Seu rosto beija o duro asfalto. Deduzo pela sua complexão muscular, exibida entre os rasgos da camisa pulverizada, que trata-se de um jovem. De sua cabeça partida ao meio, brotam suadas trilhas vermelhas, colhidas por uma dura e indiferente calçada. Antes escuros, seus cabelos estancam manchados, rubros de insanidade. Tem a idade de meus filhos. Não contenho as lágrimas. Fico ali olhando hipnotizado, como se quisesse imaginar tudo que ele poderia ter sido um dia. Penso no pai dele, na mãe, nos irmãos... Choro muito.
É noite.
Espelha o luar na poça que se forma com o sangue do infeliz, refletindo nela a violência, a miséria e a solidão daqueles tempos.
Eternas? Até quando?  As vitimas daquela crueldade arraigada deveriam estar se perguntando em uníssono em seu estertor final.
Chega a policia.
Enquanto os rabecões transportam os corpos, muitos aos pedaços, a estatística se preenche com seu números insensíveis, permanentes, purgados e infindos...
A bomba expô-se às pessoas, suas vidas e sonhos, e repentinamente, delas levou tudo. Delas não levará mais nada.
Ao final, riu-se de todos, cínica.
E infiltrou-se, um pouco mais, em nosso âmago amargo, patético, morfético, impotente...
Levantei e caminhei sem rumo, ainda com o ressoar da bomba em meus ouvidos cansados.
-Até quando? Até quando? – berrei em voz alta...
Parei um táxi e entrei.
-Me leva daqui....e desmaiei no banco.