E nada melhor do que uma poesia, saída do forno, agora, há pouco, pra oxigenar nossa existência, as vezes, tão amarga...
Em homenagem a um brasileiro de verdade - não estes que hoje enojam nossa terra - chamado Antônio Gonçalves Dias, ou "Gonçalves Dias" como o conhecemos, no ano 190º de seu nascimento, autor de um dos mais conhecidos sonetos do nosso Brasil, chamado "Canção do exílio".
Relembro:
Canção do exílio
"Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar - sozinho, à noite -
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá."
Antônio Gonçalves Dias nasceu em 10 de agosto de 1823, no sítio Boa Vista, em terras de Jatobá (a 14 léguas de Caxias). Morreu aos 41 anos em um naufrágio do navio Ville Bologna, próximo à região do baixo de Atins, na baía de Cumã, município de Guimarães. Advogado de formação, é mais conhecido como poeta e etnógrafo,
Em sua homenagem fiz a, modesta mas honesta, poesia abaixo.
(Que Gonçalves Dias se abstenha de comentar, nem se revolva em sua tumba)
PONTA DE MAR
Minha terra tem um canto
Um rasgo, um corte, um avanço,
Uma ponta de mar,
Onde a água é tão limpa,
E tão pura,
Que faz quase escura
A água mais limpa que há...
A Espinhaço, altiva e brejeira,
Esticou-se e encontrou Mantiqueira,
Que a trancos, debaixo da terra,
Emendou-se a outra serra
Se acabando em Serra do Mar
E foi neste encontro
Marcado entre Serras...
Que abriu-se, perfeito, o espaço
Na forma de abraço,
Onde o mar põe-se calmo e se aninha,
Ao sopé que se alinha
Às costas, beiradas das terras...
E à noite, um manto de estrelas
Vazado por lanças, forjadas em prata,
Pontudas, profusas, caídas do mar estelar,
Disputa brilho com a Lua,
Que volta e mais volta faz pose, se atreve, se acua,
Se faz Yemajá, lá do céu ninfa nua,
Aumenta seu brilho, e acende o lugar...
E o sabiá que se ouviu na palmeira
Que Gonçalves cantou, trás-as-Beiras,
Viajou, cá se pôs a buscar mais parceiras,
Nesta linda Ponta de Mar,
Pois sabe o sábio sabiá
Que onde a água é pura e cristalina,
É lá que vai estar a sabiá-menina
Pra beber água e quiçá, namorar...
Como se água também fosse a tinta
Que Deus preocupado, usa e nos pinta
Um quadro, um capricho, pra mãe-natureza se
Expor, ser memória, pra gente guardar...
Pra que um dia, bem longe, alhures se achar,
Peça a Deus, pois ouvindo Ele está:
“Não permita, Senhor, que da vida eu me vá
Sem que volte e desfrute os primores de lá:
Ver palmeiras, ver se encanta um sabiá,
Ver a terra se vestir de lindas flores,
Versos, Lua, Sol, o Céu, a emprestar cores,
Ver se as Serras inda abraçam aquele Mar...”
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