quarta-feira, 28 de novembro de 2012

A Ideia - Augusto dos Anjos


 

De onde ela vem? De que maneira bruta
Vem essa luz que sobre as nebulosas
Cai de incógnitas criptas misteriosas
Como as estalactites duma gruta?

Vem da psicogenética e alta luta
Do feixe de moléculas nervosas,
Que, em desintegrações maravilhosas
Delibera, e, depois, quer a executa!


Vem do encéfalo absconso que a constringe
Chega em seguida às cordas da laringe,
Tísica, tênue, mínima, raquítica...


Quebra a força centrípeta que a amarra
Mas, de repente, e quase morta, esbarra
No mulambo desta língua paralítica!




Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos (Cruz do Espírito Santo, 20 de abril de 1884 — Leopoldina, 12 de novembro de 1914) - Foi poeta.

sábado, 24 de novembro de 2012

Quando o amor acaba...

  
 
 

Escrevi uma letra para esta belíssima musica de Armando Trovajoli, tema de Mogliamante, filme com Marcello Mastroiani.
É só clicar e cantar junto.
Espero que gostem.

Abaixo a letra:


Quando o amor,
Chega pra alguém
Não vê o depois
E um amor maior
Se tem
Se existe em dois
Hoje eu sinto
O nosso amor
Chegar ao fim...
Triste, é assim...

Sem amor
O olhar se trai,
Se vê depois
E o amor
Quando se esvai,
O olhar se foi,
Foi e deixa imensa dor,
Para um dos dois
Só pra um...

Por que se acaba um amor?
Não sei, ninguém sabe dizer
Por que o fim do amor chegou?
Nenhum de nós o amor culpou
Pode parecer atroz,
Dizer que amei por dois, por nós
Que este um sente mais dor....

Eu preciso é aceitar ou vou morrer de amor
Eu preciso acreditar, que outro alguém virá,
Ou então enlouquecer, ao ver que a dor, ao fim,
Vive do amor
Em mim

sábado, 17 de novembro de 2012

Um menino chamado Rodrigo


Quando minha mãe chama: “Digo”
Vou brincando
Vou feliz
Pois eu sei que sou querido

Quando meu pai chama: “Digão”
Vou correndo
Vou sem medo
Pois eu sei que é diversão

Mas quando um dos dois grita:
RO-DRI-GO!!
Fico quieto, e digo nada
Pois eu sei : fiz coisa errada...

 

Achei esta quadrinha na internet.
Não mencionava o nome do autor

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Morre Alcione Araujo, aos 67 anos



O autor e diretor teatral mineiro Alcione Araújo morreu na madrugada desta quinta-feira (15). Alcione tinha 67 anos e foi vítima uma parada cardíaca dentro de um hotel da região da Savassi, onde estava hospedado na companhia da namorada e dos sogros.
Alcione Araújo nasceu em Januária, no Norte de Minas Gerais, e morava no Rio de Janeiro.
Atualmente, o diretor era cronista de um jornal mineiro.

Carreira
Autor, diretor e professor. Sua obra busca a síntese entre o subjetivo e as circunstâncias, o psicológico e o social.
Formado em engenharia, leciona na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Na mesma universidade, interessado em teatro, ingressa no curso de formação de atores. Em Belo Horizonte é encenada sua primeira peça, Há Vagas para Moças de Fino Trato, 1974, estudo psicológico do sofrido convívio de três mulheres e dos traumas que lhes são causados pelas relações amorosas. Ainda em 1974, o texto é novamente encenado, agora sob a direção de Amir Haddad, com Glória Menezes, Yoná Magalhães e Renata Sorrah, lança o jovem autor em São Paulo e no Rio de Janeiro. Desde então, a peça tem muitas produções pelo Brasil e em outros países do continente.
Também a segunda peça de Alcione, Bente-Altas: Licença para Dois, é encenada em Belo Horizonte, com direção de Aderbal Freire-Filho, em 1976, depois de ganhar, no Rio de Janeiro, um prêmio no concurso de dramaturgia do Grupo Opinião. Os protagonistas são dois jovens marginais recém-saídos de um estabelecimento de recuperação de menores: a ação ilustra, através de um diálogo vigoroso e colorido, as suas visões do mundo e as suas dificuldades de adaptação a uma sociedade que os segrega e reprime. Em 1976 estreia, ainda em Belo Horizonte e também com direção de Aderbal, Sob Neblina Use Luz Baixa, texto premiado no Concurso de Dramaturgia do Serviço Nacional de Teatro (SNT). O autor aborda, pela primeira vez num tratamento que tende para a metáfora e o teatro do absurdo, o triste fenômeno dos desaparecidos, cuja presença-ausência repercute no cotidiano dos familiares e leva Alcione Araújo a dissecar criticamente a instituição da família, assunto ao qual ele volta em outras obras.
Em 1981, já morando no Rio de Janeiro, estreia como diretor profissional com Doce Deleite, uma colagem de doze esquetes cômicos, dos quais oito são de sua autoria. Tanto os textos como a encenação propõem-se basicamente a servir de veículo a uma série de composições de tipos por parte da dupla Marília Pêra e Marco Nanini. O espetáculo obtém enorme sucesso de bilheteria e, após a temporada carioca, passa dois anos viajando pelo Brasil. Segue em 1981, numa produção do Teatro dos Quatro dirigida pelo autor, a comédia Comunhão de Bens, que aborda a instituição do casamento sob o prisma da recente revolução dos costumes sexuais. Muitos Anos de Vida, que dirige em 1984, lhe proporciona o Prêmio Molière de melhor autor da temporada carioca. O autor traça aqui uma feroz análise do autoritarismo dentro do grupo familiar, análise que pode ser também interpretada como uma alegoria mais abrangente sobre o comportamento das faixas mais direitistas e conservadoras da pequena classe média nacional. Em texto publicado no programa, escreve: "O que me interessa sempre como matéria-prima teatral é o homem, idéias e ideologias trazidas para o cotidiano, para as situações corriqueiras, onde princípios e doutrinas são postos em xeque. E isso no homem brasileiro".1 A Caravana de Ilusão, 1982, é montada por Luiz Arthur Nunes  sete anos depois de escrita.
Durante doze anos, leciona na Uni-Rio, na Escola de Teatro Martins Pena e na CAL - Casa das Artes de Laranjeiras. Publica artigos em veículos especializados.
Desde 1981 se dedica à atividade de roteirista de cinema e de televisão, criando, inclusive, roteiros para países estrangeiros.
Alcione Araújo escreveu famosas peças teatrais, como  “Muitos anos de vida” e “Há vagas para moças”.
O autor também assinou roteiros destinados à televisão e cinema.
Como diretor, Alcione Araújo foi um dos responsáveis pelo sucesso de Doce deleite, uma colagem de 12 esquetes cômicos encenada pelos atores Marília Pêra e Marco Nanini.

No que me tange...
Foi meu professor de Eletrônica na Escola Técnica Federal de Minas Gerais em 1969.
Muito sisudo, fechado, de pouca conversa, fumava Capri. Acendia um cigarro no tôco do outro que acabava. Teve com isto um enfarte aos 29 anos de idade. Talvez este fato tenha feito com que ele abandonasse as aulas de Eletrônica, a Engenharia como um todo e partisse para sua vocação: a escrita, o teatro, a direção teatral e cinematográfica, a criação literária.
Inteligentissimo. É uma perda para a cultura brasileira.

sábado, 10 de novembro de 2012

50 anos de "Laranja Mecânica"
09 de novembro de 2012 | 19h 01
 
A condição humana, no incômodo limite entre o bem e o mal

Excerto do Ensaio  escrito em 1973, o autor de 'Laranja Mecânica' explica as razões de seu livro


ANTHONY BURGESS

Sou, por ofício, um romancista. Acredito tratar-se de um ofício inofensivo, ainda que não venha a ser considerado respeitável por alguns. Romancistas colocam palavras vulgares na boca de seus personagens e os descrevem fornicando e fazendo necessidades. Além disso, não é um ofício útil, como o de um carpinteiro ou de um confeiteiro. O romancista faz o tempo passar para você entre uma ação útil e outra; ajuda a preencher os buracos que surgem na árdua trama da existência. É um mero recreador, um tipo de palhaço. Ele faz mímica e gestos grotescos; é patético ou cômico e, às vezes, os dois; ele faz malabarismo com palavras, como se estas fossem bolas coloridas.
O uso que ele faz das palavras não deve ser levado excessivamente a sério. O presidente dos Estados Unidos usa palavras; o médico, o mecânico, o general do exército ou o filósofo usam palavras; e essas palavras parecem estar relacionadas ao mundo real, um mundo em que impostos precisam ser arrecadados e depois evitados; carros precisam ser dirigidos; doenças, curadas; grandes pensamentos, pensados; batalhas decisivas, travadas. Nenhum criador de enredos ou personagens, por maior que seja, deve ser considerado um pensador sério, nem mesmo Shakespeare. Na realidade, é difícil saber o que o escritor criativo realmente pensa, pois ele se esconde atrás de suas cenas e de seus personagens. E quando os personagens começam a pensar e a expressar seus pensamentos, não se trata, necessariamente, dos pensamentos do escritor. Macbeth pensa uma coisa e Macduff, algo diametralmente oposto; as ponderações do Rei não são as mesmas de Hamlet. Até mesmo o dramaturgo trágico é um palhaço, soprando uma melodia triste em um trombone velho. E então seu ânimo trágico se esgota e ele se torna um bufão, cambaleando por aí e plantando bananeiras. Nada que deva ser levado a sério.


O texto completo está em
http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer,a-condicao-humana-no-incomodo-limite-entre-o-bem-e-o-mal,958141,0.htm
 

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Peso Morto


Tomei de gole o que restava da cachaça
Mirei no espelho o mal-estado da carcaça
O velho terno pernoitara, embolado, encardido,
Pendurado no varal. Houve dia peça cara, que

Uso e sebo transformara: testemunha imparcial

Cada noite, outro bar, cada trago, passo torto
Cada canto, mal-estar, cada tombo, peso morto
 
Tinha orgia? Estava lá...
Uma mulher, um corpo tido,
Cada garçom, um grande amigo,
Cada abrigo, um five-star...
 
E assim vivi, como se louco,
Assim morri, jovem, há pouco. 
O vício fez-me escravo o corpo,
À morte coube o alforriar...

 


quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Alma acuada...

Alma acuada



Lá fora
A uivante ventania
Levava pra longe
As dolentes folhas
Caídas naquela tarde cinzenta e fria,
Escondida dos raios de sol,
Desviados, encobertos...

Tarde escura...

Ímpetos de fazer loucuras, me cercam...
Tu, olhos fixos, medrosos,
Mãos atrevidas prospectam,
Tateiam, buscam juras, promessas.
Procuras o passado em meu corpo, 
Inerte, perplexo, apático,
Ou o que dele possa ter sobrado,
Após um final cruel, enfático...

Fraquejo...

Jurei deixar-te, para sempre
E agora me vejo mergulhar em teu colo,
De novo, lamber teu suor,
Cheirar o teu cheiro,
Buscar teu amor, por inteiro...

Esmolo...

Me dou sem pensar,
Me anseio, me intumo, me enteso,
Exposto em vivo-ardor...

Me esfolo..

Como mórbida sinfonia,
Tudo soa...
Quem és tu,
Quem sou eu, 
O que faço em meu vôo solo?

Me calo...

Meu rosto traz teus cabelos, revoltos....
Tua voz, em meus ouvidos, ressoa.
Pouco a pouco, ensurdeço
Envolto em doces afagos...

Desfaleço...

Me afasto, etéreo, me solto...
Me escuto dizendo sem nexo:
Minha culpa, perdoa, eu não presto...
Como se toda minh’alma, em arresto,
Aflorasse aos lábios cortados, intensos,
Pálidos e apensos...
E sábios...

Ouso trocar
O olhar manso dos prados,
Regado ao orvalho caído dos céus,
Pela ardência eflúvia de abismos,
Densos, saturados
De melodias de Iaras e Orfeus.

Falta chão, tudo some.
Tua boca em minha boca...
Louco.
Teus seios aconchegados, entesam,
Tuas mãos, mágicas, me elevam...
Sufôco !
Tuas coxas, trágicas, me encaixam.
Morro !

...uma lágrima à noite e...
Desperto, insone.
Rola gota de pura mágoa
Que traz o teu nome.

Ó flagelo! Ó açoite!
Ó insana dúvida!
Que se instala e consome...
E como a ira, 
É pérfida, purga, eriça,
Apronta o bote...

Então tu, a dormir... choraste !

E havia em teu lamento
A tristeza tíbia do vento,
Que varre as folhas em minhas tardes.

Ó Melancolia eterna...
Tu que habita e hiberna,
Se esconde da luz que brilha
Deste sol
Que insiste, e nasce,
Queima o peito
Inflado por ações soberbas...

Covarde ! Covarde!
Assaltam à mente, as falácias...

Escurece...

A tarde,
Se faz chama,
Que inflama, arde
Derrete gestos, impostos, aceitos,
Impróprios conceitos, confesso...
Mas...
Faz brotar em mim,
Um grito, um clamor, afinal
Um sopro de vida,
Resumido a tênue poesia :

Ai de ti
Ó alma acuada,
Não percebes quão maior é
A ânsia de quem perdeu um amor ?.”

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Submissão...


Qual poliglota
Em várias línguas
Em finos tratos
Seduz aos saltos
E atrai-se à mingua

Armando a sina
Se faz, incauto,
Se finge casto,
Posa de fausto
Emposta a crina...

Se o corpo atina,
Assalta em falso
Esvai-se em versos
Maltrata rimas

Externa a voz
Em farsa e esmero
No afago arteiro
Do amar sem pós

Paira e flutua...


Apraz-se em bocas
Mãos minhas, suas,
No sexo, loucas,

Envolve-o inteiro,
Por cio, amparas
Nas coxas nuas
Nas parcas roupas
Nas peças, poucas
Salpicam gotas
Nas fendas cruas

Em bentas taras
As prendas postas
Nas cavas, fossas
Nas poças fundas,
Invade e apossa
E o abraço freme,

A femea estreme...
No espasmo, o cume...
O corpo geme,
O gozo é morte,
E o rico sêmem,
Avança à sorte,
Surfando onda,
Cevando impune...

domingo, 9 de setembro de 2012

Meus 60 anos...



No proximo dia quinze(15/9), passo a ter o direito de pagar meia ou furar filas em bancos e em outros calvários brasileiros.
Meus 60 anos vem aí. 
O danado é que me sinto como se tivesse só 30... 
Mas o espelho e o cardiologista não deixam por menos. 
O que fazer?  
Fazer 60 e continuar, até onde der...


60 anos, eu faço
40 anos, me dão
20 anos, foi traço
80 anos, sei não...

60 anos de luta
40 anos, fui fera
20 anos? só puta !!!
80 anos, na espera...

60 anos, confessa
40 anos, só pressa
20 anos, fui nessa
80 anos, despeça...

60 anos, difícil, não minto
40 anos,  vai antes um tinto?
20 anos, isto é que é pinto !!!
80 anos, e eu, mal o sinto...

60 anos,  100%  aberto
40 anos,  100%  acerto
20 anos,  100%  esperto
80 anos,  100%  incerto

60 anos, parece um engodo...
40 anos, parece tão probo...
20 anos, aparece, e eu fôdo !!!
80 anos, parece que é lôdo...

60 anos, só falando em lembrança...
40 anos, olha aí o tamanho da pança !
20 anos, outra vez? Não se cansa ?
80 anos, liga não, é igual a criança...

60 anos, aviou-se, discreto
40 anos, mexeu nele, tá reto
20 anos, nem piscou, tá ereto
80 anos, Viagra ao teto, e + afeto...

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Concierto a puertas cerradas - por Tomás Castro*




Con estas manos hechas para ti
quiero
uno a uno tocar
los instrumentos de tu cuerpo

al palparte
me salen tonos
partituras
música en fin
de todas partes

se precisa un golpe
de batuta
para tocarte sin desafinar

estás llena de violines
en ti los pájaros ensayan
sus últimas canciones
en ti debuta una alta fidelidad
que termina
entre mis dedos
haciéndote fraterna

amo tus instrumentos
cuando me inundas de sonidos
cuando tu cuerpo me nombra
el músico más grande

que nadie se sienta herido
– ni bach ni beethoven
ni los trompetistas del juicio final –

eres un concierto
que sólo yo puedo tocar.


* Nasceu em Santo Domingo, Republica Dominicana, (1959). Poeta.
Formado em Letras e Literatura pela Universidad Autónoma de Santo Domingo

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

alguns poemas de Antonio Carlos Secchin*...

1- Biografia


O poema vai nascendo
num passo que desafia:
numa hora eu já o levo,
outra vez ele me guia.

O poema vai nascendo,
mas seu corpo é prematuro,
letra lenta que incendeia
com a carícia de um murro.

O poema vai nascendo
sem mão ou mãe que o sustente,
e perverso me contradiz
insuportavelmente.

Jorro que engole e segura
o pedaço duro do grito,
o poema vai nascendo,
pombo de pluma e granito.


2-  Ou


você pode me pisar
que nem confete
você pode me morder
que nem chiclete
você pode me chupar
que nem sorvete
você pode me lanhar
que nem gilete
só não pode proibir
que nem piquete
se eu quiser escapulir
que nem pivete


3- À noite


todas as palavras são pretas
todos os gatos são tardos
todos os sonhos são póstumos
todos os barcos são gélidos
à noite são os passos todos trôpegos
os músculos são sôfregos
e a máscaras, anêmicas
todos pálidos, os versos
todos os medos são pânicos
todas as frutas são pêssegos
e são pássaros todos os planos
todos os ritmos são lúbricos
são tônicos todos os gritos
todos os gozos são santos


4- "Estou ali..."


Estou ali, quem sabe eu seja apenas
a foto de um garoto que morreu.
No espaço entre o sorriso e o sapato
há um corpo que bem pode ser o meu.

Ou talvez seja eu o seu espelho,
e olhar reflete em mim algum passado:
o cheiro das goiabas na fruteira,
o barulho das águas no telhado.

No retrato outra imagem se condensa:
percebo que apesar de quase gêmeos
nós dois somos somente a chama inútil

contra o escuro da noite que nos trai.
Das mãos dele eu recolho o que me resta.
Chamo-lhe de menino. Mas ele é meu pai.


5- Tempo: saída & entrada


No tempo de minha avó,
meu feijão era mais sério.
Havia um ou dois óculos
me espiando atrás
de molduras roídas.
Mas eu era feliz,
dentro da criança
o outono dançava
enquanto pulgas vadias
dividiam os óculos.

Dentro da criança,
as pulgas espiavam
o outono vazio,
dividiam minhas molduras
roídas por óculos vadios.
No tempo de meu feijão
minha avó era mais séria.

* Doutor em Letras pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.

sábado, 18 de agosto de 2012

Vida-flor




Houve um tempo,
Um momento incolor, 
Desalento...
Tudo em mim fez passado, cessou,
Pensamento vazio, o inverso do amor....
E o tempo a passar, a passar ... e passou...

Quis jamais que o amor se acabasse,
Mas querer só, não mostra a outra face,
E se não foi meu querer,
Por que haveria o impensável, romper?
Eu não sei, eu não sei, vai saber...

Só depois... bem depois
Sonhei ter lassidão, calmaria.
Frustração,
De quem perde a razão de viver,
Perde via a traçada pro ser, 
Como um cego na rua sem guia,
E sem cão...

Ledo engano.
As agruras mais vis, renitentes,
Aliadas ao medo, parceiro presente,
Nesta luta em que a dor me venceu,
Desigual, arrasou, corroeu,
Derrotou coração persistente...

Desprezível emoção...
Revelou todo lado impotente,
Fez de mim um perdido, um doente,
Por sentir tentação, por ainda te amar,
Ou pedir pra morrer,
Pra poder te alcançar
No infinito possível da mente...

E chegou o pior: solidão.
Oh! parceira invisível de toda paixão,
Que nos mata de dor, frustração,
Que a remove da luz,
Que celebra este breu, 
Que envolveu, submissas,
As Iaras aos mandos de Orfeu...
Fez-se a noite.
E a seu fim,
Foi-se o Eu...

Mas,
Sem querer ou porque,
Ou quem sabe do nada,
Junto ao Sol, novo amor, veio a pino,
Sem medir, se importar em ser fino,
Simplesmente chegou, sem se impor,

Me tirou do estupor,
De menino,
Enrustido, infantil, e fugindo...
Em suas asas o tempo parou...

Meu Coração,
Qual deserto areado, acolheu...
E a semente insistente, brotou,
E se abriu entre espinhos da dor...

Me senti primavera no amor,
Espalhando consigo a beleza,
Trazendo consigo a certeza
Do esquecido e esperado esplendor...

Oh! Quero-me seu...
Paisagem de céu matinal
Verdejantes, seus campos tranqüilos
Coloridos, qual mar de coral,
Ela veio e...
Moldou-se a mim por igual.

Vejo em mim,
Hoje sei,
Velha dor já se foi, descolou,
E o deserto, que um dia foi parte do fim,
Em jardins, resurgiu, floresceu...